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Denise: Olá, pessoas. Estamos aqui com João Alvarenga. Ele passou por tantos segmentos, que a gente achou que ia ser tão rico para nós e para vocês explorar esse tema que é a gestão da complexidade, agilismo, transformação digital, mas com alguém que pode falar da sua percepção nos segmentos muito distintos. Hoje ele é CIO do Hermes Pardini. Para nós ainda é bem conhecido como Hermes Pardini, mas no Brasil, Pardini. Queria começar, João, que você falasse um pouquinho da sua trajetória, dessa sua percepção do que tem acontecido com os modelos de gestão desde o início da tua carreira.

João: Bom dia a todos. Bom dia, Denise. Bom dia, Szuster. Prazer estar aqui com vocês. Espero contribuir para toda comunidade. Realmente, eu passei por diversos segmentos na minha história profissional, desde a indústria, até tecnologia da informação, e nos últimos 10 anos bem na área de saúde. Sempre atuando na área de tecnologia da informação, a minha formação é em cima disso. Notando, durante todo esse tempo de carreira, várias coisas boas, várias coisas ruins, projetos bem sucedidos, projetos mal sucedidos e com isso a gente aprende. Eu costumo brincar que a gente aprende muito mais no erro, do que no acerto. O erro traz lições aprendidas que geralmente a gente não repete esse erro, a gente busca não repetir. Isso proporciona uma maturidade maior para enxergar, não só a tecnologia em si, que eu acho que cada vez mais vem nivelando, mas aspectos de cultura, aspectos de comunicação, aspectos de gestão, que eu acho que são tão ou mais importantes dos que simplesmente os aspectos técnicos.

Denise: Excelente. Bem aderente ao que a gente tem ouvido aqui de outros convidados, não é, Szuster? Bom, não apresentei o Szuster, mas, Szuster, bom dia. Boa tarde. Boa noite.

Szuster: Bom dia. Hoje a Denise seguiu o script diferente. A gente sempre homenageia você no Pires falando: “bom dia, boa tarde, boa noite”. Não é, Denise?

Denise: Sim. João nesses últimos 15 anos, o que essencialmente mudou em sua opinião em relação aos desafios para os gestores?

João: Vou até começar com uma provocação.

Denise: Adoramos.

João: Eu vou pegar o Douglas McGregor e vou defendê-lo um pouco aqui. O lado da teoria X. Eu acredito que todos esses movimentos, de melhores práticas, de métodos de gestão, de frameworks, eu acho que na realidade ele traz por trás uma tentativa de aproximar mais as pessoas, para que no final do dia a comunicação ocorra. Eu acho que esse é o principal motim por trás disso tudo. Então, a gente faz um embrulho diferente, de tempos em tempos, mas…

Szuster: …começar a fazer as pessoas se comunicarem.

João: Se comunicarem. Então, por que a teoria X bate com esse meu conceito? Eu vou ser uma pouco radical, só para extremismo aqui, mas vejam bem, não é oito ou 80 nunca na vida, sempre o meio é o correto. Partindo dessa teoria, e de que a comunicação está por trás disso tudo, a gente pode elencar alguns exemplos. O ser humano não sabe comunicar. Quando comunica, comunica no meio errado, muitas vezes. Preguiçoso. Se isolam nos seus silos, nos seus departamentos. Se apegam muito ao escopo e a especificações. Invariavelmente, dentro do ambiente corporativo, com as vaidades, podem ocorrer atritos entre essas pessoas. É evitado conflito. Até mesmo conflitos salutares. É evitado. As pessoas não gostam do conflito. E não conflitando, a comunicação não ocorre. Muitas vezes, transferências de responsabilidade: “eu fiz minha parte, a outra parte não fez. O outro departamento não fez. Quem especificou, especificou errado”. Muitas vezes não existe um engajamento como deveria ter, na proporção que deveria ter, e muitas vezes não pensando no cliente final. A gente estava conversando aqui antes. Não existe um cliente interno, não, o cliente interno está ali, mas sempre com o objetivo final de atingir o seu cliente final. Então, basicamente, partindo dessa teoria X, na minha opinião, o movimento ágil, best practices, frameworks, vem tentar cobrir esse gap, fazendo, no final do dia, a comunicação ocorrer, entre cliente, entre pessoas, entre departamentos. E aí a gente começaria a falar de estruturas em redes, que são essenciais. Não sei se vocês me compreenderam. Eu acho que por trás de tudo isso…

Denise: …tudo isso é a linha da comunicação.

João: …é a linha da comunicação.

Denise: Mas você acredita que o ser humano é assim ou a gente foi moldado por um longo período da história a se comportar dessa forma?

Szuster: É isso que eu ia dizer. Porque parece, assim, pelo menos na minha visão, as estruturas tradicionais agravam ainda mais esse tipo de questão, porque a pessoa não tem segurança para se posicionar, ela tem que responder uma meta local, então ela não vai se comprometer. Então, é uma questão tão estrutural, que a questão de ser X ou Y é acreditar. É quase que se você acredita que o ser humano vai ser daquele jeito, preguiçoso em qualquer lugar, ou se você acredita que na verdade o ser humano chega motivado e o que desmotiva é a estrutura, é o ambiente, é a forma que o trabalho é organizado. Então, nesse sentido eu acredito que a estrutura. Eu tenho falado dessa metáfora outras vezes, não é?

Denise: Muito.

Szuster: Da molécula da água. É uma metáfora que eu acho interessante. O cara fala assim: “poxa, a água pode estar no estado líquido ou sólido. A molécula é a mesma, H2O. Não adianta você pedir para uma molécula de H2O no gelo ficar mais dinâmica. Porque ela está no gelo”. Você sabe que essa analogia de mudança de fase, toda hora eu vejo um livro que tem analogia com essa mudança de fase que é assim, a empresa é de um jeito, de repente ela vai crescendo, e vira outra coisa. Como se fosse uma mudança de fase. Por exemplo, a política começa a imperar mais do que a vontade de contribuir. Os caras observam isso, a empresa vai aumentando, aí de repente, em um momento anterior o cara sentia que a contribuição era importante, ele começa a sentir que é mais importante aparecer para o chefe e é como se fosse uma mudança de fase. Você não acha que é uma questão estrutural do que propriamente intrínseca do ser humano?

João: Sem dúvida. Eu fiz uma provocação, mas o cenário, o ambiente, também molda o comportamento. Você vai atuar de acordo com o que seus pares já atuam. Você já chega em uma empresa, observa o cenário, observa a cultura. E muitas vezes a estrutura organizacional te cerca, te molda, esperando um determinado comportamento.

Denise: Isso é bem interessante, porque são temas recorrentes aqui. Quando você foi falando, eu fui lembrando de Maslow e tal. Que eu falo: “ok, a gente é social. Mas antes de ser social a gente quer sobreviver”.

João: Exatamente.

Denise: Então, se eu sinto que a estrutura ou a cultura me ameaça, ao invés de colaborar, eu me protejo. Isso a gente vê direto. Isso não é uma culpa, uma questão do colaborador, do líder. Isso é o nosso instinto de sobrevivência. Então, a gente vê hoje, tem discutido aqui, como que a gente pode, à medida que o negócio tem que escalar e tem que lidar com essas mudanças, essas ameaças, a empresa tem que ser mais responsiva, para onde que a gente vai olhar? Como conciliar essa questão, de nós somos sociais, mas de repente a gente tem uma estrutura que desestimula essa interação, nós somos sociais, mas a gente foi estimulada a trabalhar em grupos muito pequenos, que não se comunicam muito bem, que você citou, os silos. Fica parecendo que a gente gosta do silos, essa que é a provocação que a gente está fazendo aqui. Mas não é que a gente gosta do silo, a gente foi levada a se comportar dessa forma. Porque quando você pega gerações mais novas, elas querem uma comunicação mais fluida, mais transparente, um feedback constante, que é esse modelo que é favorecido com as redes. Ele quer atuar em rede, porque ele nasceu em uma estrutura tecnológica que permite com que ele se conecte com o mundo inteiro. Então, ele vem para a empresa e ele quer manter essa fluidez. E aí a gente tem uma estrutura clássica que poda um pouco isso. Tem uma tensão aí.

João: Sem dúvida. Mas esses movimentos, esses frameworks, essas melhores práticas, elas ocorrem e surgem fortemente no mercado, principalmente por conhecer essas estruturas rígidas na maioria das organizações.

Denise: Para nos ajudar a flexibilizar.

João: Para nos ajudar a sair disso.

Denise: Muito interessante essa colocação.

João: Ela entende isso, ela sabe. A estrutura é difícil, é engessada, o que fazer? Então, nesse cenário ela entra com uma série de inovações, principalmente estruturais, culturais, favorecendo a comunicação.

Szuster: É uma coisa, a gente estava conversando, João, agora a gente percebe que está ficando meio inexorável. Não está mais sendo opcional. Eu sempre gosto de falar para os céticos, que nos ouvem. Alguns céticos falam: “isso é modinha. Comunicação que nada. Nós temos que trabalhar”. Como é que você enxerga isso? Por que é tão importante comunicar ainda mais nesse momento, e por que isso não é mais modinha?

João: Não é. Eu acho que, eu sempre falo isso, também nas minhas aulas, se fosse para escolher um vilão do mundo corporativo eu escolheria comunicação, como número um.

Denise: Que é tão subestimado.

João: Que é tão subestimado. E aí, Szuster, completando a sua pergunta, eu acho que o cenário macroeconômico mundial, e também nacional, está favorecendo muito a essa nova forma de pensar. Eu acho que o mundo volátil, em constante movimento, o próprio medo do empresariado nacional hoje, em relação a essas mudanças, a startups, a negócios que da noite para o dia morrem, isso causa um medo muito grande no empresariado, um desconforto muito grande e a própria crise nacional que a gente já vem passando, de três cinco anos para cá, são momentos que a gente tem uma abertura maior para entrar com essa nova forma de pensar, para mitigar todos os problemas. Porque em uma crise você tem que ser altamente eficiente. Não pode faltar nem sobrar, você tem que realmente trabalhar, em uma economia de escassez e continuando a render o mesmo tanto ou mais. É mais que a gente precisa render nesses momentos. Eu acho que os cenários, com esses exemplos, favorecem muito a abertura da mentalidade dos C-Level e do conselho de administração para uma nova necessidade. Já entrando um pouquinho na prática. Eu venho notando isso na pele. Notando que realmente isso vem acontecendo e para minha satisfação a área de tecnologia da informação está mudando e está liderando em muitas organizações esse movimento. E favorece muito a área de tecnologia da informação o conhecimento do negócio. Muitas vezes quem faz, em projetos cascata, quem que é chamado para desenhar processo? O usuário da ponta não consegue desenhar o processo da área dele, quem conhece o fluxo do início ao fim geralmente é um profissional da área de TI. Então, a gente está conseguindo…

Szuster: …com posição melhor. (inint) [00:13:05] que isso é a vingança dos nerds. O pessoal: “aqueles nerds não entendem nada, não sabem nada”. Agora a mudança vem lá de dentro. Curioso demais. O cara que fosse congelado e acordasse hoje, iria falar: “o quê? Nós temos que fazer gestão que esses caras estão falando?”.

João: Tem a competência técnica, que é intrínseca, mas agora a gente demonstra uma competência gerencial e uma capacidade melhor, na minha opinião, de ouvir o cliente. Então, não é somente a área comercial que está em campo, que está ouvindo e que talvez possa trazer algo mais enviesado. Não, é uma ida ao campo nossa, a TI nunca tinha ido ao campo, a TI tem ido ao campo. Escutar o cliente, identificar a jornada, identificar pain points, trazer para priorizações, trabalhando em MVPs e antes que termine o produto, volta de novo no cliente: “é isso que você quer mesmo? Tem certeza?”. E aí volta para casa e desenvolve aqueles sprint final, aquele produto, semi-produto final, mas que tem uma assertividade muito grande. Então, eu fico muito esperançoso e feliz com esse movimento que está surgindo de dentro da área de TI, mas que está contaminando a organização. Estou sentindo muito isso na prática. E o melhor aprendizado é esse.

Denise: Eu queria ver um exemplo, de uma evidência que isso está acontecendo.

João: Claramente a gente nota que a TI vem ficando mais ágil e a TI sempre era reativa, ela passou a ser proativa, e de duas em duas semanas, de três em três semanas, ela cobra uma validação de um cliente interno ou externo, isso nunca acontecia. A gente pegava uma especificação, famoso escopo, um escopo de 12 meses para ser executado, é outra brincadeira que eu faço, não existem mais projetos de 12 meses, podem existir 12 projetos de um mês. Isso já quebra um paradigma grande, de que a gente não tem a necessidade, nem a competência, ninguém tem essa competência, de escrever um escopo de 12 meses. Quantas coisas vão mudar, a especificação vai estar falha com certeza. Então, vai ter erro. Então, a gente com ciclos menores, que aí você citou o escopo, é outro movimento que eu acho que vem por trás, junto com a comunicação, uma quebra de paradigma, é quebrar esse escopo em partes menores. Isso é essencial. Voltando para a sua pergunta, eu vou chegar lá, quebrando esse escopo, times multidisciplinares, que é outra coisa que a gente vem conseguindo, a gente consegue gerar entregas muito mais velozes, em uma velocidade até então que a companhia não esperava da tecnologia da informação e que agora a gente começa ter. E aí uma área de marketing, área comercial, área de produção, área de operações, área de recursos humanos começam notar algo diferente. Falam: “o que está acontecendo? Está acontecendo alguma coisa aqui naquela área. Posso ir lá ver?”, “pois não. Você é muito bem-vinda. Na equipe multidisciplinar, mais ainda você é bem-vinda”. E essa turma começa a frequentar a área de tecnologia da informação para entender o que está por trás. E a gente tem caso aqui, clássico, da participação efetiva da nossa área de recursos humanos, vindo aqui na DTI, ouvindo as palestras, tirando foto com o Szuster.

Denise: Pedindo autógrafo.

João: Isso é muito legal porque, ao meu ver, é um aprendizado duradouro. Não é uma palestra do RH, um treinamento no Youtube. Não é isso.

Denise: Aqui na DTI a gente chama isso de change by doing. A cultura já está transformando, não tem que ter um treinamento, você está fazendo, você está executando.

João: E a gente tem medo, a gente acha que vai demorar muito para a cultura pegar.

Denise: Exatamente.

João: E às vezes é mais simples do que a gente imagina. Educação pelo exemplo. (inint) [00:17:13] nossos filhos, na educação pelo exemplo. Também acontece educação pelo exemplo dentro das companhias.

Szuster: Eu acho curioso essa analogia que eu fiz de mudança de fase, parece que está acontecendo com o mercado em relação ao ágil. Eu falo porque desde 2000 que eu falo desse troço. Você era rechaçado em alguma época, totalmente rechaçado parecia que era doido. E agora virou tão mainstream. É como se tudo tivesse acabado a permeabilidade, essa onda passou para todas as empresas. Para mim o sintoma disso é o que você falou, hoje a gente recebe C-Level aqui, a gente recebe gente do negócio, o assunto virou um assunto de todo mundo, não é um assunto só da TI mais. Qual seria o interesse que alguns anos atrás um diretor de outra área teria de visitar uma DTI? O cara não teria interesse nenhum. Que para ele aqui era uma caixa preta, de um projeto que alguém vai me entregar. Agora ele entende que a cocriação, geração de valor contínua, e que isso é estratégico. Então, ele fala, eu tenho que me aproximar e tenho que entender isso.

João: Szuster, é interessante essa questão de continuidade, que a gente começa a falar mais de gestão de produto do que propriamente gestão de projeto.

Denise: Exatamente.

Szuster: (inint) [00:18:29].

João: Definição clássica de (PMI) [00:18:31] tem início e fim.

Denise: Muito interessante isso.

João: Em uma gestão ágil, não, você tem vários releases. E aquele produto vai sempre evoluindo e sempre gerando algum benefício para o cliente final. Então, é outro ponto para a gente pensar na gestão de produto. Logicamente que a gestão de projeto continua importante. Lógico, acho que tem que ter gestão. Vamos tirar nomenclatura, tem que ter gestão de algo, tem que ser uma gestão, você tem que gerir. Mas a gestão de produto ganha uma importância muito grande nesse ambiente.

Szuster: João, uma pergunta que a gente faz e não tem como não repeti-la sempre, porque o público nosso que ouve são grandes empresas que tem uma estrutura que as trouxe até aqui, mas que talvez não as leve para frente. Isso que é a grande interrogação que as empresas têm. Como é que você começa um movimento desses em uma corporação grande, que tem uma estrutura tradicional e de sucesso? Porque as pessoas acreditam muito isso, não sem razão, no sucesso. E que tem orçamentação tradicional, exige ROI, cálculos de VPL. Como é que começa isso? Aqui não é para dar prescrição, não. A gente sempre fala isso para os ouvintes. É para dar inspirações ou possibilidades para cada um pensar como começa. Como é que você enxerga isso hoje em dia? Que é uma dificuldade, você chegar lá, vai ter um CFO ali.

Denise: E eu queria complementar a pergunta do Szuster. Olhando para trás, todos os segmentos que você trabalhou, você diria que é para todos esses segmentos? Responde o Szuster primeiro, e eu te lembro dessa. Porque eu acho muito importante. Quem nos ouve vem de qualquer segmento. Como que é essa adaptação, essa resistência, que ele colocou uma empresa que é líder, que tem sucesso?

João: Eu acho que, como tudo na vida, se aprende, ou no amor ou na dor. Então, é um dos dois caminhos, Szuster. Ou você tem o visionário no C-Level, em uma presidência, um conselho muito maduro, que já está enxergando esse movimento, olhando para o lado e vendo: “opa, o que essa turma está fazendo de bom? Está trazendo resultado, vamos olhar com carinho? Está tudo lindo, maravilhoso, aqui em casa, mas tem gente talvez fazendo melhor”. E aí é no amor. Agora, muitas vezes, eu acredito que na maioria, na minha opinião, aí Denise, já pegando um pouquinho da sua pergunta, pelas indústrias, pelas empresas que eu passei, na maioria das vezes, na minha opinião, é na dor. Então, é quando você mesmo sendo líder de mercado em todas essas empresas que eu já trabalhei, você começa a perder uma fatia desse bolo, principalmente por empresas novas que nascem com uma agilidade na veia, diferente de empresas de 50 anos, 60 anos, começa a perder um pouco de mercado, Szuster, começa a perder um pouco de receita, principalmente hoje em dia, margem. Hoje é um problema seríssimo margem. Estava conversando com uma empresa ontem de Telecom, está sendo bombardeada por todos os lados.

Denise: WhatsApp.

João: É Whatsapp, é TV a cabo, é telefonia, são dados. Ela está sendo bombardeada por todos os lados. Então, é queda de margem. Empresas super tradicionais. Líder de mercado passando por uma dificuldade enorme, de queda de receita e de margem. Quando você tem esses movimentos de perda, e aí todo mundo sente. Porque você tem orçamento a cumprir, você tem reuniões semanais com a diretoria, presidência, reuniões mensais, bimensais com conselhos de administração. E a turma quer saber o porquê. Por quê? Porque não está cumprindo? Você tem que ter uma resposta para isso. E aí você olha para o lado e você vê, tem gente fazendo diferente. Na sua essência, tentando resumir, pelo nosso tempo, eu acho que ouvir, verdadeiramente, o cliente talvez seja um dos grandes motivos dessa perda de receita, de margem, de não ser uma empresa focada no cliente. Porque colocar no PowerPoint o cliente no meio, todo mundo coloca. Mas quem que realmente faz isso? Isso é muito difícil. A gente pensa que é simples.

Denise: E quando você coloca, você vê que a sua estrutura não dá conta de lidar com isso.

João: Sabe como eu chamo isso? Eu chamo isso de (Go Digital versus Be Digital) [00:23:15].

Denise: Boa.

João: O Go Digital, eu vou no mercado, vou na banca de revista, compro um APP na banca de revista. Você acha que está resolvido? Está um produto, com interface linda, com o seu usuário. O seu usuário dá dois cliques e já consegue fazer uma marcação de qualquer tipo de serviço que ele precisa. Opa, já sou digital. Resolvi o meu problema. Quando esse cliente precisa, a primeira vez que ele vai precisar de uma interação formal com a sua companhia, ele nota ali que são dois mundos. Ela é tão moderna aqui no APP, no site e tão engessada e tradicional.

Denise: Tem um atrito, não é?

João: Um atrito.

Denise: Um atrito. Uma experiência. O fluxo se quebra.

João: Se quebra. O Go Digital é fácil. O Be Digital é o difícil.

Szuster: Uma coisa impressionante. A gente sempre comenta isso, muitas vezes a empresa cria um departamento de Customer Success, aí esse departamento vira um cliente da empresa.

Denise: Exato.

Szuster: Ele só é o cara que anota o pedido do cliente, mas ele enfrenta a mesma estrutura anterior. Eu acho isso um negócio tão impressionante. Como que é que a empresa não enxerga isso. Você está botando um cara ali intermediário, para anotar uma reclamação ou um pedido no cliente, mas ele enfrenta exatamente a mesma estrutura que já tinha. Não sei quem começou a ouvir o podcast mais recente, um dos primeiros episódios, achei o seu comentário bem bacana, quando a gente fala das leis do agilismo.

Denise: Sim.

Szuster: A gente falava de a empresa ser customer centric e o cara faz uma analogia muito boa, o autor do livro. Ele fala assim: “a revolução é quase igual à revolução que teve de Aristóteles para Copérnico. Você tirar a terra do centro do mundo para botar o sol”. Alguém podia falar assim: “beleza, agora o sol virou o centro”. Mas quando o sol virou o centro, os modelos todos mudaram. As órbitas, todo o jeito que você calculava, mudou tudo.

Denise: É uma boa analogia.

Szuster: Não é só botar o cliente no centro, você tem consequências profundas na sua estrutura.

João: Exatamente. Tem que ter essa atenção. E ter humildade sabe, Szuster e Denise. Eu acho que a humildade sempre é bem-vinda. A humildade de todo aquele conhecimento que você já teve.

Denise: O desapego. Tem que aprender. Para aprender eu tenho que abrir mão de alguma coisa.

Szuster: Tem que ser budista as empresas.

João: A gente tem que rasgar, Szuster, muitas vezes esse conhecimento. Abrir a cabeça para essas coisas novas. Essa humildade é muito importante, dentro ainda da sua pergunta, de como fazer isso, que na maioria das vezes, em minha opinião, é na dor, é perdendo no mercado, é perdendo na receita. E voltando à origem de nunca esquecer de que as soluções têm que vir, ou principalmente hoje, não 100 por cento, mas você não pode perder isso de vista, que muitas vezes essas empresas campeãs, líder de mercado, 50 anos de idade, 40 anos de idade, sempre tinha um pressuposto, traziam um pressuposto, que as soluções viriam de dentro para fora do mercado.

Denise: Da experiência.

João: “Eu sou tão bom nisso. Eu sou líder. O cliente vai se adaptar ao que eu oferecer”. E não é verdade isso. Então, tendo a humildade de voltar a campo e ouvir, que foi o trabalho que a gente fez. Que a gente começou, iniciou. A gente teve surpresas. Vamos desenhar a nossa jornada. Aí a gente desenha dentro de casa. Vamos validar no campo? Vamos. 70 por cento de erro.

Denise: Sempre surpresa.

João: A gente pega coisas, muitas vezes simples, que dá um efeito. Sabe o pareto ali? 80, 20? É uma coisa de um dia de trabalho, sem exagerar, você faz uma coisa que dá um efeito que você não acredita. Então, não perder isso. Como que acontece esse movimento? Acontece a partir de uma dor que é sentida e a partir da humildade de que eu tenho que voltar a campo e ver o que está acontecendo de bom, porque os clientes estão saindo. E aí ouvindo esse cliente, é essencial ouvir verdadeiramente para voltar dentro de casa, e aí vão vir todas as transformações de cultura necessárias, para que essa empresa também seja ágil internamente e também não esqueça nunca que as soluções, pode ser um modelo híbrido? Pode. Mas as soluções devem vir, em minha opinião, na priorização de projetos, devem vir de fora para dentro e não mais de dentro para fora.

Denise: E que gera valor na ponta.

João: E que gere valor.

Szuster: Você falando muito de humildade. De alguma forma, não era esse o principal valor até então. Na verdade, a gente vê líder super orgulhoso e sempre achando que concebe a solução. É curioso. A era anterior nossa não é marcada por isso. Essa humildade ela parece que começa a ser necessária quando você tem que levantar as premissas que você tinha do passado e começar a explorar ambiente novo. Porque não é o comum. Concorda?

João: Não era. Nunca foi.

Szuster: Ninguém quer demonstrar fragilidade. Para muitos líderes isso é quase que uma fragilidade: “eu tenho que ir lá perguntar. Eu sei. Eu entendo o meu negócio”. Não é isso?

João: Sempre foi assim: “quem vai opinar aqui dentro? Eu que já conheço o que tem que fazer”.

Denise: Os colaboradores também com essa expectativa. Ele é o líder, ele tem que ter feito por merecer. Então, ele tem a resposta, tem o caminho. Historicamente, o líder é esse cara, que você olha, se você está perdido você olha para ele para a resposta, não para as orientações de valor e só. Ele sabe o que fazer. Se tudo falhar, ele sabe o que fazer. E a gente está falando de um outro tipo de líder. Eu queria colocar uma questão aqui que ela tem me incomodado muito, que a gente está falando de uma mudança de paradigmas mesmo, de modelos. Szuster fez a analogia com o modelo heliocêntrico. Sabe o que eu vejo? Algumas empresas, especialmente as muito bem-sucedidas, as líderes ou que tenham experimentado a liderança, elas veem a crise econômica, e elas, por causa da crise econômica, estão deixando de ver a grande mudança. Porque a crise econômica passa. Mas eu vejo elas se agarrando isso, não. Se sentido, qual que é o contrário do frágil mesmo?

Szuster: Robustas?

Denise: Robustas. Empresas que olham e falam, não, ok, está acontecendo uma crise, mas acha que é só uma crise econômica, não entende que é uma crise do modelo de gestão.

Szuster: Acha que vai passar.

Denise: Acha que vai passar. Eu tenho visto isso.

João: E que não vai mudar. Só esperar o governo que tudo vai se resolver.

Denise: Exato. Que vai se resolver. Ela não entende que quando passar essa crise ela deveria estar aproveitando isso, já que ela é robusta ou ela se encara como uma empresa robusta, então, ela vai aguentar esse golpe, depois ela vai voltar tão forte quanto ela era, deixando de aproveitar esse momento para experimentar esses outros modelos. Eu vejo que o que a gente tem em comum com todos os nossos convidados, é que a mudança também ela não vem pela ruptura, da nossa parte, ela vem pela experimentação, você vai aprendendo e vai escalando. Como é que você vê essa questão da inovação de ruptura e a inovação incremental quando a gente fala de agilismo? Eu vejo que é um discurso novo, em relação ao que a gente via há 10 anos. Tinha um encantamento da ruptura, só que a ruptura trazia uma paralisia, porque a gente não consegue lidar muito bem com a ruptura, nós na empresa. Quando vem uma força de fora e ela fala: “caramba, esse modelo é totalmente diferente do meu. Então, eu tenho que lidar com a ruptura”. Mas nós mesmos, na empresa, provocarmos a ruptura é algo muito violento.

João: Eu acho, Denise, o que a gente sente do mercado? Também é um momento, esses movimentos de inovação, de digitalização, que no final do dia vão trazer melhorias para os nossos clientes, seja B2B, seja B2C, é muito bem visto pelo mercado. Então, a gente começa a falar de valuation, e dentro do valuation a gente começa a pensar, isso é quase que natural, é até interessante essa pergunta, eu não tinha pensado nisso, abre a cabeça da turma, da companhia, para oportunidade de novos negócios, explorar novos mercados. Os movimentos em si, esse foco no cliente, quando você está ouvindo o cliente em uma entrevista, no one-to-one com ele, ele te fala algumas coisas que você pega aquilo e fala: “opa, isso aqui pode ser uma oportunidade de pivotar o meu business”. Então, eu acho que vai de encontro ao que você estava falando, de aproveitar essa oportunidade de economia de escassez, para mudar a sua gestão interna, humildade isso tudo que a gente falou, mas também a cabeça aberta para inovação disruptiva de abertura de novos modelos de negócio, que podem ser tão mais rentáveis quanto o seu business principal. Então, eu acredito muito nisso, de ter que se reinventar nesse momento e a cabeça aberta para a abertura de novos modelos de negócio. Eu acho que isso talvez seja uma oportunidade que a gente não pode deixar passar nesse atual cenário que a gente vive.

Denise: Muito interessante. A gente está chegando aqui no final, infelizmente. Senão a gente ficaria aqui uma hora.

João: Passou rápido.

Denise: Passa muito rápido. Mas eu acho que, essencialmente de tudo que você falou, coisas riquíssimas, foi uma troca muito boa, é: precisamos ir para o Gemba, precisamos ver o que acontece, de fato, com o nosso cliente. Sair do desktop, sair do nosso escritório, observar e estar aberto para ouvir. Tanto para corrigir, quanto para pensar em novos modelos e novas propostas, novos produtos.

João: E sabe uma coisa legal, Denise, que esses projetos, a gente nota agora com essa forma de trabalho, que a gente consegue justificar mais facilmente os benefícios quantitativos. Porque a gente, até aí, sempre teve dificuldade de justificar projetos, porque na maioria das vezes, eles eram qualitativos, era difícil falar que ia gerar mais receita, que iria gerar uma abertura de novos negócios.

Denise: Que interessante isso. Eu não esperava.

João: E agora, eu sentindo isso, trabalhando e vivendo isso, eu consigo ter mais pegas, eu consigo ter mais justificativas, argumentos para colocar número. E principalmente no momento atual do país, você precisa colocar número. Não vai aprovar projeto só por ser bonitinho. Ele tem que trazer retorno. Então, a gente consegue enxergar, olha o que interessante, olha como que a coisa vai evoluindo, benefícios quantitativos, que antes eram mais difíceis de serem quantificados. Então, isso também ajuda muito dentro do cenário que a gente acabou traçando hoje.

Szuster: Uma coisa que eu achei muito legal nessa conversa toda, uma coisa que até nas palestras que eu faço sempre fica uma pergunta assim: “por que é tão difícil?”. Porque assim, existe um gap de execução enorme, é difícil, todo mundo sabe que tem que mudar. Mas você vê, você falou muito, humildade, desapego aqui. Eu acho, assim, se a gente for lá no ser humano, não sei onde o estudo acontece, definitivamente, ninguém é muito formado para ser assim nas corporações. Mas na hora que você começa a ver esse tipo de palavra dentro das corporações. Porque isso era completamente, na única experiência que eu tive dentro de empresa grande na minha vida, depois que a TAM foi comprada por uma grande consultoria, eu não consigo imaginar você preservar a sua carreira, o seu plano de carreia, se você ficar falando de humildade e desapego.

Denise: Paradoxo, não é? É estranho.

Szuster: Parece cultura ocidental versus oriental. Eu tive essas reflexões. Chega a ser engraçado porque a questão é, você não deixa de ser competitivo, você não deixa de correr atrás, não deixa de querer fazer sucesso, mas você ter humildade para entender que você não entende o ambiente, que você tem que ficar aprendendo o tempo todo. Mas isso não combina, definitivamente, com a forma que a gente é criada, e que os filmes americanos mostram. Sempre são os líderes fodões, que sabem tudo. Então, eu acho isso muito interessante. Eu gosto de ir muito no humano. Por que é tão difícil sendo que todo mundo sabe? De cara ninguém desapega do cargo, nem do modelo tradicional e ninguém tem essa coragem de falar: “eu não sei o que eu vou fazer”. Igual você comentou: “eu vou lá e pergunto e sou surpreendido”.

João: Sempre. Eu acho que humildade é igual sobrevivência, na minha opinião.

Szuster: Isso já virou o título do podcast.

Denise: Ótimo. Porque o título emerge durante o processo.

Szuster: Isso é um ótimo título. Humildade igual a sobrevivência.

Denise: Excelente. Bom, pessoas, ficamos por aqui. Continue com a gente. Um beijo.

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os agilistas

#36 Humildade é igual a sobrevivência.

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