Jobs-to-be-done: como a teoria dos trabalhos pode ajudar em Gestão de Produtos 

Por Daniel Leto Neiva|
Atualizado: Jul 2023 |
Publicado: Mai 2021

Há pouco mais de um ano que um dos gurus da Harvard Business School veio a falecer, mas o seu legado com a teoria Jobs to be done, além de relevante, é completamente necessário no dia-a-dia das equipes de TI no Brasil. Tendo material publicado em diversas áreas, Clayton Christensen foi o autor de obras como “O Dilema do Inovador” e “Muito Além da Sorte”. Neste artigo, estendemos nossos estudos na teoria e trouxemos um exemplo prático. Confere aí! 

O que é Jobs to be done

Jobs to be Done (JTBD), ou teoria dos trabalhos, é uma abordagem de inovação que se concentra na compreensão das necessidades e motivações dos consumidores ao usarem um produto ou serviço. Em vez de se concentrar apenas nas características do produto, o Jobs to be done se concentra nos “trabalhos” ou tarefas que os clientes estão tentando realizar ao usar um produto ou serviço específico. Essa abordagem ajuda as empresas a entenderem melhor as necessidades dos clientes e a projetarem produtos e serviços que melhor atendam a essas necessidades específicas, levando a uma melhor satisfação do cliente e a um maior sucesso no mercado.

Talvez a história mais famosa sobre teoria dos trabalhos seja o marketing do milk-shake. Explico: não faz muito, a equipe de Christensen foi contratada para aumentar as vendas de milk-shake do McDonald’s. Eles aplicaram a teoria para compreender o valor do produto e, dessa forma, construir uma estratégia de marketing em cima do real valor gerado. Confira:

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Mc Donald’s e o poder da ação  

A primeira abordagem, utilizando principalmente técnicas tradicionais de marketing, passou por um misto de estudo dos dados disponíveis e pesquisas de satisfação, gerando insights valiosos sobre perfis de consumo (as populares “personas”) e jornadas do cliente. O plano de ação, como de praxe, englobou a atuação nos principais pontos levantados.  

Algum tempo depois, para a surpresa de muitos, verificou-se que o investimento não pareceu ter afetado as vendas, tanto para cima quanto para baixo. Intrigados com o não-resultado, a equipe realizou uma sombra (técnica de UX que consiste em acompanhar a utilização dos produtos pessoalmente) de 18h em uma das unidades nos EUA. O máximo de informações foi coletado: se as pessoas iam sozinhas ou acompanhadas; se consumiam apenas o milk-shake; se chegavam de carro ou a pé; onde consumiam, dentre outras análises qualitativas que nem sempre seriam possíveis avaliando os dados. 

As informações levantadas são tanto quanto interessantes: a maioria das vendas ocorreu bem cedo durante a manhã, o que pode parecer contraintuitivo. A equipe partiu, portanto, para as perguntas sobre o porquê. Diversas respostas foram ouvidas: 

  • “Eu como bagels, mas passar cream cheese enquanto dirijo é muito difícil” 
  • “Bananas não me mantêm cheio até a hora do almoço” 
  • “Eu como Snickers, mas eles me fazem sentir culpado” 
  • “Donuts não são muito saudáveis” 

Transformando entrevistas em insights

O que tudo isso tinha a ver com milk-shakes foi a grande sacada! Essas pessoas estavam contratando o produto para solucionar um trabalho maior: o de manter uma distração no longo trajeto ao trabalho. E nenhum dos citados acima resolvia tão bem o problema quanto o milk-shake: ele era viscoso, e demorava para acabar, além de manter as pessoas satisfeitas até o final da manhã. Além disso, é extremamente prático de ser consumido, não precisava de muito esforço.  

Não é óbvio, mas muitas vezes a concorrência pode não ser o que se imagina. Por que as pessoas compram o seu produto? Ele concorre apenas com os outros Burger King’s, Subway’s e afins? Qual é real valor ele oferece ao consumidor/usuário? Simon Sinek, em seu épico TED Talk de 2009, descobriu que as pessoas não compram o que você faz, e sim porque você faz. Quem descobre os trabalhos dos usuários tem esta vantagem competitiva. 

Aplicando a teoria: Jobs to be done  

A lógica, na verdade, é muito simples de entender: quem compra uma furadeira não quer uma furadeira, mas sim um suporte de TV instalado na parede. Se hoje fosse inventada uma supercola facilmente removível que servisse para fixar o eletrônico, provavelmente seria o concorrente da Bosch. O real desafio é saber que o seu cliente quer assistir Snowpiercer em um ângulo que o seu pescoço pare de doer. E, no fim das contas, ainda desocupar aquele rack que ele sempre esbarra. 

Quais os trabalhos que os seus usuários estão tentando executar? Esse é o óbiceEat your own dogfood’ é um mantra repetido continuamente no clássico ‘A Startup Enxuta’. Se você utilizasse seu produto, ele resolveria o seu problema? Você estaria comprando algo que te ajudaria a ser coisas extraordinárias? Esse exercício constante de empatia pode ser extremamente efetivo ao gerar novas features e descartar algumas. Basta começar pelo porquê. 

O contato constante com os clientes também é essencial: Marty Cagan define um mínimo semanal de 30 minutos entre pessoas de produto e usuários. Essa insistência leva à percepção dos pequenos detalhes, como o horário estranho de consumo de uma sobremesa, que pode ser a chave para entender o que seus usuários não sabem que eles precisam.  

Precisamos olhar para trás 

“Se perguntássemos o que os clientes falariam antes de inventar os carros, eles pediriam cavalos mais rápidos”

A clássica frase atribuída a Henry Ford (embora isso não tenha sido provado) é colocada em questionamento.  A questão está voltada ao inovador: ele tem que saber a forma correta de perguntar. Você espera que as pessoas inventem os carros por você, ou elas só querem formas de transporte mais rápido? 

No fim das contas, algumas modificações no fluxo dentro das lojas e algumas adições de frutas aos milk-shakes acabou por fazer as vendas estourarem, pois aperfeiçoavam ainda mais o que já resolvia bem o trabalho dos clientes.  

 

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